Foi aprovado no dia 27/03/2012 pela Assembléia Legislativa da Bahia, o Projeto de Lei da Deputada Luiza Maia, conhecido como Lei Antibaixaria que proíbe o gestor estadual de contratar ou fazer convênios com bandas/músicos para eventos em que sejam executadas músicas que desvalorizem, incentivem a violência ou exponham as mulheres e homossexuais ao constrangimento, ou ainda incentivem o uso de drogas ilícitas.
Agora o Projeto segue para o Governador Jacques Wagner que provavelmente irá sancioná-lo, deixando para o Poder Judiciário o papel de corrigir o grave equívoco com a sua aprovação. Explico. Este Projeto de Lei é visivelmente inconstitucional, na medida em que resgata a famigerada censura que grassava na época da Ditadura Militar e havia sido extirpada da nossa sociedade pela Constituição Cidadã de 1988. Isso porque ao definir que fica proibida a contratação de artistas que tocam músicas que desrespeitam as mulheres, haverá que ser decidido quais serão estas músicas e quem será o censor que irá decidir quais letras são ou não atentatórias à dignidade da mulher?
Lembro com esta situação do período do Regime Militar em que um milico, nomeado como censor, recebia as letras das canções e decidia quais eram as que atentavam contra os “bons costumes”. Nesta quadra, canções como a bela “Fado Tropical” de Chico Buarque (dentre tantas outras dele, como Cálice, Construção, Apesar de Você, etc), Prá não Dizer que não Falei das Flores de Geraldo Vandré, Deus e o Diabo de Caetano Veloso, Geleia Geral de Gilberto Gil, apenas para citar algumas, foram ceifadas dos nossos ouvidos e corações por conta da estúpida censura. Só de pensar no retorno destes tempos me dá calafrios, vai de retro satanás...
Lamento que tal proposta tenha surgido da deputada que é uma das mais qualificadas da atual legislatura da assembleia baiana e que foi, inclusive, perseguida e vítima da Ditadura Militar, tendo sentido de perto a crueldade daquele regime de exceção.
O fato de deputadas como Luiza Maia, ser autora de uma proposta que resvala perigosamente para restauração da censura na sociedade, apenas encerra algumas conclusões, quais sejam: os políticos, com raríssimas exceções, para aparecerem na mídia, fazem qualquer coisa; a qualidade dos atuais políticos, também com raríssimas exceções, está abaixo do desejável; e o Poder Judiciário vem galgando cada mais importância na sociedade, estimulado pela judicialização do debate político e pela consolidação do ativismo judicial.
Por que menciono o Judiciário? Porque virou lugar comum os políticos transferirem para aquele Poder, a tomada de decisões que reponham os pontos nos is, ou seja, a tomada de decisões que anulem ou redirecionem decisões equivocadas do Legislativo e até mesmo do Executivo. Vide, apenas a título de exemplos, a decisão do STF sobre a questão da fidelidade partidária, da Lei da Ficha Limpa e até da Marcha da Maconha. A propósito, ainda recentemente, José Sarney, presidente do Senado, declarou que faria consulta ao Supremo Tribunal Federal acerca do procedimento de tramitação das Medias Provisórias.
No caso da Lei Antibaixaria, porque como dito, o Governador Jacques Wagner não vai correr o risco de não sancioná-la e ter ameaçada a sua imagem, ficará, por certo, para o STF a decisão a respeito da questão e certamente a Suprema Corte irá dizer em alto e bom som que a Constituição Federal não permite qualquer tipo de censura, de modo que caso exista uma música que atente contra a dignidade da mulher, caberá à própria sociedade censurá-la, não adquirido os CDs com a música e não indo para os shows do músico, sem excluir a possibilidade de o autor pagar indenização pela sua conduta.
Miguel Cerqueira, advogado. Salvador, Bahia, 28/03/2012.
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