'Éramos uma família, todo mundo unido', lamenta o carpinteiro Damião Queiroz, de 53 anos, pelos nove colegas mortos no acidente em canteiro de obras do edifício Empresarial Paulo VI, localizado na Avenida ACM, em Salvador.
Os operários estavam em um elevador, chamado por eles de balança, que caiu do 20° andar por volta das 7h30 desta terça-feira (9). Três equipes dos bombeiros foram encaminhadas para atender a ocorrência. Segundo testemunhas, as nove pessoas que morreram estavam dentro do elevador e mais ninguém ficou ferido.
A altura da queda corresponde a cerca de 70 metros, distribuídos ao longo da estrutura, que conta ainda com oito pavimentos de estacionamento. 'Eu já estava lá em cima, junto com mais de dez pessoas. Vi os cabos desenrolando, o pessoal falava que ele tinha defeito', conta Damião.
Operários do canteiro de obras e representantes de sindicatos acreditam que o acidente foi ocasionado por defeito elétrico no elevador. 'Este é o nosso trajeto toda a manhã. Por volta das 9h, sempre descemos para lanchar, por exemplo. Naquele momento estávamos indo armar os pilares na cobertura. Eu estava embaixo, esperando a próxima viagem', conta o armador José Félix de Oliveira, de 55 anos.
Segundo o operário, um defeito elétrico fez com que o elevador não parasse, batesse na torre e o impacto quebrou o clipe que sustenta o equipamento. 'Nossos irmãozinhos foram embora, estamos chocados', completa José Félix, que trabalha há um ano e dois meses na obra.
A construtora Segura divulgou nota por volta das 12h30, afirmando que o equipamento funcionava de forma regular. A empresa diz ainda que acompanha de perto as investigações pela perícia técnica e destaca que o elevador estava dentro dos parâmetros de segurança e em perfeito estado de conservação. Ainda segundo nota, a construtora Segura está dando apoio aos familiares das vítimas.
Para o presidente da Fetracom - BA (Federação dos Trabalhadores da Indústria da Construção e da Madeira da Bahia), José Nivaldo Souza, o acidente foi decorrente de falta de manutenção. 'Há indícios de que o equipamento já havia dado problema em outras obras. O dispositivo que tem a função de parar o elevador, quando acionado, não parou, bateu na torre e explodiu. É muita negligência. Este equipamento tem uma chave que, quando o operador aperta, tem que parar, mas isso não aconteceu', afirma.
O presidente da Sintracom-BA (Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção e da Madeira da Bahia), José Ribeiro, disse que esse foi o pior acidente do setor que ele presenciou nos últimos 35 anos. 'As empreiteiras são obrigadas a investir em segurança para evitar acidentes. Você pode ver que está tudo espalhado, inclusive equipamentos na calçada, na via pública. Tem pedaço de ferro, de madeira. Esta situação não pode acontecer', relata o sindicalista.
O pedreiro Mário Sérgio, de 35 anos, é operário da mesma construtora, mas trabalha em outra obra. Ele estava no canteiro para homenagear os colegas que morreram no acidente. 'Eu trabalho há nove anos na empresa e esse é o acidente mais grave que vi. Eu não gosto de elevador, faço questão de subir de escada. O elevador é para subir material, mas esse [do acidente] foi autorizado para transportar pessoas', conta.
Os corpos dos trabalhadores foram retirados do local e encaminhados para o Instituto Médico Legal (IML), em Salvador. Familiares de vítimas passaram mal e foram socorridos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Terceira maior cidade do País, Salvador tem 53 acidentes de trabalho no setor de construção civil somente em 2011, segundo a CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil). Os acidentes, segundo a central, causaram 13 mortes – nove delas foram registradas na manhã desta terça-feira (9), após a queda, do 20º andar, de um elevador em prédio em construção na capital baiana. Falha mecânica e excesso de peso são possíveis causas do acidente. Ao todo, são 18 mortes em canteiros de obras na Bahia neste ano, segundo dados da Superintendência Regional do Trabalho no Estado.
De acordo com a CTB, a Bahia ocupa a sétima posição entre os Estados brasileiros em registros de acidentes de trabalho, atrás apenas de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
'Existe muita irresponsabilidade por parte do empresariado. As mortes, previsíveis, evidenciam descaso com a vida do trabalhador. Estamos cansados de avisar às autoridades, mas a fiscalização e o investimento em segurança são insuficientes', disse o secretário de Saúde e Segurança no Trabalho da CTB, Fernando Dantas.
O Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção) da Bahia informou que, pelos últimos dados da Previdência Social disponíveis, o número de mortes em acidentes de trabalho permaneceu estável no estado. Foram 15 mortes em 2006, o que perfaz 18,8 mortes por 100.000 trabalhadores, e 17 em 2008, ou 17 por 100.000.
O Ministério do Trabalho informou não dispor de dados sobre acidentes fatais de trabalho no país. O Sistema Federal de Inspeção do Trabalho realiza inspeções somente por amostragem – de 923 acidentes analisados de janeiro a junho de 2011, 283 (30%) foram no setor da construção.
Quem compila as informações sobre acidentes de trabalho no país é a Previdência Social, mas os últimos dados divulgados são de 2008. Os dados nacionais apontaram crescimento de 69,3% no número de acidentes de trabalho na construção civil entre 2006 e 2008. O número de mortes aumentou 25% no mesmo período, e os acidentes que causaram incapacidade permanente subiram 37%.
O setor da construção civil na Bahia emprega 185.000 trabalhadores com carteira assinada, e acompanha a expansão da área no país – o PIB da construção no estado cresceu 4,2% no primeiro semestre do ano.
Uma operação do Ministério do Trabalho realizada em outubro e novembro de 2010 em Salvador e na vizinha Lauro de Freitas encontrou 26 obras em condições que comprometiam a segurança do trabalhador.
Fonte: SINTRACOM/BA, FETRACOM/BA, CTB e iG Bahia
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